Personagens que perduram
Também penso frequentemente em Jacinto, uma personagem encantadora, pela sua ingenuidade, que se deixou render pela bucólica vida das serras (uma poesia pastoral que está quase sempre reservada para pessoas de posses), onde viria a encontrar a felicidade.
Sonho frequentemente com isso: mudar-me para uma qualquer serra. Viver com umas galinhas e com os meus livros.
Outra personagem (real) que também nunca esqueci, é Débora, a filha de Henrietta Lacks (A vida imortal de Henrietta Lacks), marcada pela ausência de uma mãe sempre presente e pela injustiça do que esta representava:
(...) sempre pensei que era estranho, se as células da nossa mãe fizeram tanta coisa pela medicina, porque razão a família dela nem sequer tem dinheiro para ir ao médico? Não faz sentido. As pessoas ficaram ricas à conta da minha mãe sem que nós soubéssemos que lhe tinham tirado as células, e agora não vemos um tostão. Costumava ficar tão zangada com isso que adoeci e tive de tomar comprimidos. Mas já não tenho forças para lutar. Só quero saber quem foi a minha mãe.
Em suma, concluo que as personagens não permanecem comigo tanto pelo que são, mas pelos momentos marcantes que representam: o desespero da pobreza e a fome que tanto me assustam e causam compaixão; o deixar tudo para encontrar a felicidade num outro mundo; a injustiça e o amor filial.